Uma vez também eu fui burra. Fui-o durante muito tempo. Uns anos, para ser mais precisa. Eu amava com o coração na boca. Durante tempos, eu deitava-me todos os dias a imaginar o dia em que voltávamos a estar juntos, fechava os olhos na esperança de acordar ao teu lado ou de te rever naqueles que tinham sido os melhores dias da minha vida até então, os quais passaram um pouco sem lhes dar o devido valor - como a maior parte dos dias que nos ficam na memória, persistindo -, porque nunca imaginei o seu fim. Era uma miúda. Uma miúda tola que via o fim do mundo feliz ali, por ter tido a sorte de te ter só para mim e nada mais importar além disso. Eu amava-te. E isto ninguém pode negar. Tu sabias.
Eu fui burra. Fui burra na medida em que te amava e não via o reverso da moeda. Apesar de ver, não queria ver. Eu habitava em ti. Eu habitei em ti durante muito tempo: disso tenho certezas e hei-de ter por muito que me mintas. E se assim era, porque nunca nos amámos novamente na mesma medida?
É aí que entra a explicação para a minha burrice aguda. Para a minha e para a burrice de todos os que amam na esperança de reaver aquilo que morreu um bocadinho, mas nunca totalmente - porque amores desses na verdade nunca morrem. Nunca, porque até agora ainda te guardo, como se pode ver nestas palavras que escrevo, livre de ressentimentos.
As histórias de amor começam quando um de nós ama. Basta isso! E é mesmo aí. Quando damos por ela já está. Tudo estragado! Tudo estragado porque histórias de amor em que um só por si ama, das duas uma, ou sofrem a grande reviravolta esperada e têm um final feliz, ou estão arruinadas, destinadas a não passar do "pior que estragado". Porque sejamos francos, as histórias de amor acabam como começam: quando apenas um ama. Ninguém minimamente inteligente quer ser a vela de um barco mais que naufragado.
E, convenhamos, quando digo amar, refiro-me ao real sentido da palavra, talvez remontando ao século dezanove, quando amar não significava estar habituado à presença de alguém, querer passear no teu carro para sempre ou viver confortavelmente uma relação que até não me faz nenhum mal. Porque desenganem-se aqueles que namoram há anos e acham que têm na mão para a eternidade aqueles com quem se deitam e acordam todos os dias. Amar não é isso.
Amar é não ter propriedade de ninguém. É acordar todas as manhãs com o sentimento de sorte por termos alguém tão especial ao nosso lado, capaz de lutar connosco e por nós. É sentir que a qualquer momento essa pessoa nos pode fugir das mãos e por isso querer andar com ela de mãos dadas, com força, para todo o lado. Amar é aproveitar as coisas simples da vida e fazer delas únicas. É trocar o dinheiro por o luxo de provocar momentos. É pensar nos próximos quarenta ou cem anos e ver essa pessoa sempre na nossa vida.
A minha burrice aguda sempre foi essa mesmo: amar.
E assim me mantenho fiel.
Façam-no. Amores grandes um bocadinho desarmados, não são amores para a vida.
Amizades, talvez devam ser para sempre.
É assim que te vou guardar.
Apesar de tudo.
É assim que o devem fazer também.
É assim que o devem fazer também.
Patrícia Luz
20 de Novembro de 2013
Foto: Filipa Marques (www.behance.net/philipa-marques, visitem!)
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